Em tempos de consumidores mais conscientes e exigentes, muitas pessoas tem buscado informações a cerca dos produtos que consomem, é assim com os vegetais onde são exigidas informações se o cultivo é orgânico e sobre a procedência das frutas e verduras, comprovadas por meio de rastreabilidade (saiba mais sobre Rastreabilidade dos Alimentos e a Segurança Alimentar nesse outro artigo do Blog); e também quando o alimento é de origem animal, onde os clientes querem saber se os mesmos não sofreram maus tratos durante o processo produtivo e se as necessidades básicas dos animais foram respeitadas.

O termo bem-estar relaciona-se ao aspecto físico e mental quanto ao conhecimento, avaliação e garantia das condições para satisfação das necessidades básicas de um determinado ser vivo. Ao relacionar o termo saúde com o bem-estar deve-se compreender que o mesmo se refere a um estado de harmonia, de equilíbrio dos sistemas corporais que participam do combate aos patógenos, da recuperação dos danos teciduais e/ ou dos transtornos fisiológicos.

Com respeito aos animais, refere-se a quanto tem de ser feito para o mesmo conseguir adaptar-se ao ambiente e ao grau de sucesso com que isto está acontecendo. Todavia esse processo de identificação e mensuração da qualidade de vida dos animais é um tanto quanto subjetivo, por isso, para facilitar a mensuração em 1965 na Inglaterra foi criado um relatório sobre o bem-estar animal e as a cinco liberdades , a saber:

  • Livre de fome e sede;
  • Livre de desconforto;
  • Livre de dor e doença;
  • Livre de medo e stress;
  • Livre para expressar seu comportamento natural.
Na prática, o que podemos fazer é garantir condições para que os animais possam se adaptar da melhor forma possível, ao ambiente, por isso quanto melhor a condição oferecida, mais fácil será a sua adaptação. Dessa maneira, para identificar se o bem-estar está sendo oferecido aos animais, existem indicadores comportamentais e fisiológicos que podem ser utilizados para a avaliação. Os mais utilizados são: comportamento anormal, motivação, vocalização, saúde, doença e estresse.

Esse relatório serviu de base para quantificar o processo de garantia de qualidade de vida dos animais, viabilizando leis e normas tanto locais quanto em tratados internacionais de comércio. Uma vez que muitos países, pressionado pelos consumidores, impõem exigências legais e regulamentares que determinam o estabelecimento e cumprimento do bem-estar no manejo dos animais, para poder ser comercializados, bem seus produtos derivados.


Por que deveríamos nos preocupar com o bem-estar dos animais?


Os principais motivos que levam as pessoas a se preocuparem com o bem-estar de animais de fazenda são inquietações de origem ética, o efeito potencial que este possa ter na produtividade e na qualidade dos alimentos.

Por exemplo, na Rússia um projeto piloto está equipando vacas com óculos de realidade aumentada para acalmá-las visando a geração de leite em maior quantidade e de melhor qualidade. No Brasil, a empresa Chip Inside desenvolveu uma tecnologia capaz de monitorar os animais 24h e analisar se um animal está doente ou no cio, a coleira C-Tech.

No Brasil, um estudo realizado pelas pesquisadoras Maria Yunes e Maria Hötzel, da UFSC, e Marina Von Keyserlingk, da University of British Columbia indica que a maioria dos consumidores brasileiros preocupa-se com o bem-estar dos animais que dão origem aos alimentos, uma entrevista com 500 consumidores concluiu que 87% das pessoas preferem a ausência de confinamento e 78% dos entrevistados optaram pela criação livre de gaiolas. A razão para essas preferências, é a percepção de que os animais livres para se mover e expressar seu comportamento natural tem mais qualidade de vida. Entretanto, muitas vezes a população tem uma consciência limitada dos sistemas e práticas de produção de alimentos de origem animal e criticam a qualidade dos produtos finais e a vida levada pelos animais (sofrimento, liberdade, saúde) e riscos subsequentes para a saúde humana.

Os atores dessa cadeia


Defendendo a bandeira do bem-estar animal, muitos atores participam pro-ativamente e são referência nesse processo, como por exemplo podemos citar a figura de Adroaldo Zanella, professor e pesquisador da USP, referência internacional no assunto que em 2018 recebeu o 2º Prêmio de Bem-estar Animal da Associação Mundial de Veterinária (WVA) durante os 34º Congresso Mundial de Veterinária. O Brasileiro estudou o papel de fatores ambientais no comportamento animal e desenvolveu métodos para medir o bem-estar em sistemas de produção. Suas pesquisas revelaram biomarcadores de estresse em diferentes espécies, avaliaram o impacto do pré-natal no comportamento e demonstraram a influência do estresse e de doenças na organização do cérebro dos animais.

Certificadora Humane Outro importante ator dessa cadeia são as certificadoras, como a Humane Farm Animal Care (HFAC), a principal organização internacional sem fins lucrativos de certificação do setor e presente em 9 países, tem a missão de melhorar a vida dos animais criados em fazendas e granjas direcionando a demanda do mercado
para produtos elaborados com práticas mais humanizadas e responsáveis de criação. No brasil é representada pelo Instituto Certified Humane Brasil e seu selo garante aos consumidores que os produtos de origem animal e seus derivados atendem às melhores práticas de bem-estar animal, do nascimento ao abate.
Apoiado pelos demais fomentadores dessa cadeia, temos o produtor rural que sensibilizado com a causa, atendendo às exigências da legislação ambiental e/ou ainda visando o mercado formado por consumidores mais exigentes, adota e implementa práticas que asseguram um tratamento digno aos animais. A Fazenda da Toca do ex-piloto Pedro Paulo Diniz é um belo exemplo de propriedade que adota as melhores práticas do conceito bem-estar animal, tanto na produção de leite e seus derivados quanto na de ovos orgânicos provenientes de galinhas criadas livre de gaiolas (Cage-free).

Por fim temos os consumidores, mais exigentes e conscientes que demandam produtos produzidos de uma maneira mais ética e humana.

Na contramão desse movimento...


Podemos destacar o polêmico sistema de produção da vitela, onde bezerros são colocados em baias com espaço limitado evitando que se exerça as funções mais básicas de locomoção, ao privar que se exercitem ou recebam banhos de sol, os animais não desenvolvem músculos e sua carne é considerada mais macia pelos consumidores. Além disso a alimentação é bastante calórica (para que engordem rápido), privada de ferro (para que a carne fique mais clara) e é totalmente líquida para que sejam forçados a comer o máximo possível (mesmo quando sentem-se apenas sede). Para evitar que se agitem, criem úlceras ou ferimentos, frequentemente esses animais também são privados de luz. Esse mercado surgiu em decorrência da indústria do Leite, pois como as vacas precisam de filhotes a cada 13 ou 14 meses para dar leite, quando nasce um macho eles geralmente são descartados ou aproveitados para fazer vitela (uma vez as raças otimizadas para de gado de corte são outras).

Bem como o foie gras, patê gorduroso feito com o fígado dilatado de patos, gansos e marrecos, uma iguaria típica da França é também um grande exemplo de crueldade com os animais. Para que o órgão fique superdesenvolvido, as aves são submetidas a uma vida de privações, manejo confinado e uma alimentação forçada, nesse sistema as luzes permanecem acesas a maior parte do tempo para que os animais fiquem acordados e se alimentando o máximo possível, com pouco mais de 4 meses as aves estão prontas para o abate.

Diversos grupos de direitos animais têm agido contra a produção de práticas polêmicas em todo o mundo, como as adotadas no foie gras ou na carne de vitela, argumentando que estes produtos são produzidas de forma cruel, como na maioria dos países não há lei que proíba essas práticas, cabe ao consumidor consciente escolher melhor quais produtos serão ingeridos.

Conclusão


Muitas práticas usadas em sistemas intensivos de produção animal parecem distantes dos valores e expectativas morais de muitos consumidores e isso pode ser um problema sério para as empresas que não souberem se adaptar às exigências do mercado e pode colocar em risco a sustentabilidade de longo prazo dessas indústrias, seja prejudicando a imagem de uma marca que adota essas práticas ou ainda causar a evasão de potenciais consumidores.

Por exemplo, o crescimento do veganismo nos últimos anos pode ser um reflexo disso, alguns veganos alegam motivos de saúde enquanto outros dizem ter pena dos animais sacrificados, o fato é que esses consumidores param de consumir produtos de origem animal, na alimentação ou no vestuário. De qualquer forma é preciso atenção, mudanças drásticas no processo de criação de animais, podem ser caras para os produtores, inviabilizar ou diminuir drasticamente a escala de produção, por isso é preciso muita cautela e diálogo junto a sociedade e aos órgãos reguladores para encontrar um ponto de equilíbrio.

A discussão é extensa e de grande importância espera-se, no entanto, que os produtores sejam estimulados a implantar programas gradativos que melhorem a qualidade de vida dos animais criados, respeitando sua integridade e visando maior qualidade de produção devido à condição de vida do animal.

É importante destacar a contribuição da tecnologia e da inovação no processo de melhoria do bem-estar, como exemplificado pelas coleiras de monitoramento de comportamento ou ainda pelos óculos de realidade virtual implantados nas vacas, felizmente podemos esperar então por novas tecnologias capazes de contribuir com um tratamento mais digno e ético. Os animais agradecem!

Sobre o autor

Eduardo e Kawana
Eduardo Rezende é Formado em Ciências da Computação pela Universidade Federal de São Carlos e pós graduado em Consultoria Empresarial pela Fundação Instituto de Administração.

Kawana Miranda está cursando agronomia pela UNIPAC Uberlândia.

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